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Chilenos rejeitam por ampla margem nova Constituição com viés de esquerda

05 de setembro de 2022

Boric convoca partidos para reunião com objetivo de 'dar continuidade ao processo constituinte' após derrota significativa para movimentos sociais progressistas

Chilenos rejeitam por ampla margem nova Constituição com viés de esquerdaChilenos fazem fila para votar no Estádio Nacional, em Santiago, no plebiscito constitucional realizado nesse domingo (4) – Foto: Javier Torres/AFP

Os chilenos rejeitaram por ampla margem, no plebiscito desse domingo (4), a proposta de nova Constituição, escrita para substituir a vigente no país, herdada da ditadura de Augusto de Pinochet. Com 95% dos votos apurados, a rejeição tem 61,92%, contra 38,08% da aprovação.

Políticos da base do governo de Gabriel Boric, que apoiou o projeto da nova Carta, reconheceram a derrota da opção "aprovo". "A proposta não conseguiu convencer a maioria", escreveu no Twitter o senador Jaime Quintana, do Partido pela Democracia.

O resultado representa uma significativa derrota para os movimentos sociais de esquerda do país. Em 2020, cerca de 80% dos chilenos votaram em outro plebiscito para que houvesse uma mudança constitucional, e a Convenção Constitucional que redigiu o projeto da Carta, eleita no ano passado, tinha maioria de esquerda e independentes que, em sua maioria, vieram dos grandes protestos sociais de 2019.

Ao contrário das outras votações dos últimos 13 anos, incluindo a que convocou a Convenção Constituinte, desta vez o voto foi obrigatório. Quinze milhões de chilenos estavam aptos a votar, e mais de 12,54 milhões compareceram às urnas. Desde o início o dia, a população foi às zonas eleitorais em grande número, e locais como o Estádio Nacional registraram filas. O governo fez uma avaliação positiva das operações, tanto por parte das autoridades eleitorais quanto dos meios de transporte.

Enquanto a apuração ainda estava no início, o presidente chileno, Gabriel Boric, enviou uma carta a todos os partidos convocando para uma reunião no Palácio de La Moneda na tarde desta segunda-feira, como o objetivo de promover "um espaço para o diálogo transversal sobre os desafios que devemos enfrentar como país por dar continuidade ao processo constituinte", diz a carta, divulgada pelo jornal La Tercera.

Após o resultado, Boric fez um pronunciamento chamando as forças chilenas ao diálogo e a um novo processo constituinte. Boric disse que o “maximalismo, violência e intolerância devem ser definitivamente postos de lado”, e que “o desconforto ainda é latente e não podemos ignorá-lo”.

“Prometo fazer tudo da minha parte para construir, junto com o Congresso e a sociedade civil, um novo itinerário constituinte que nos dê um texto que, reunindo as lições aprendidas, consiga interpretar a vontade da grande maioria dos cidadãos”, afirmou. “Não esqueçamos por que viemos aqui. A decisão dos chilenos exige que trabalhemos com mais esforço, diálogo, respeito e carinho, até chegarmos a uma proposta que responda a todos, que nos dê confiança e nos una como país”, completou.

A Assembleia Constituinte chilena, a primeira com paridade de gênero do mundo, tinha maioria absoluta de esquerda, sem que direita alcançasse um terço dos assentos para ter direito a veto. Os deputados constituintes escreveram o projeto de marco constitucional ao longo de um ano e introduziram diversas inovações, como a validade de um sistema judicial indígena, uma forte proteção ao meio ambiente, além de abrir caminho para o direito ao aborto e da garantia de educação, saúde e Previdência públicos.

Apesar de boa parte das novidades responder ao movimento de protesto deflagrado em 2019 que deu origem ao processo constitucional, a postura combativa de muitos dos constituintes gerou uma forte rejeição de setores expressivos da sociedade. Muitos chilenos perceberam uma ambição de refundar o país, com uma alteração excessiva de normas, do Judiciário ao poder do Executivo. A rejeição confirma todas as pesquisas de opinião ao longo de meses.

Com a derrota, legalmente, a Constituição escrita em 1980 durante a ditadura de Pinochet e reformada várias vezes na democracia, permanece vigente.

No entanto, quase todas as forças políticas chilenas – com a exceção de José Antonio Kast, ex-candidato da extrema direita nas eleições do ano passado – concordam que será preciso reiniciar um processo de redação de uma nova Carta para substituir a de Pinochet.

O presidente Gabriel Boric já disse que o governo promoverá uma votação para os chilenos escolherem os membros de uma segunda Convenção Constituinte, para os deputados escreverem outra proposta de Carta. O presidente disse que esse novo processo se estenderia por um ano e meio.

O Congresso precisa aprovar essa proposta de Boric, e há divergências a esse respeito. A direita – que tem a maioria na Câmara, e domina metade do Senado – não deseja um novo processo com constituintes eleitos, mas sim que parlamentares e notáveis conduzam o processo.

Durante sua campanha a favor da rejeição, o Chile Vamos, a coalizão que agrupa a direita e a centro-direita, apresentou 10 compromissos que assumirá no caso hipotético de um novo processo.

Entre eles está a "modernização e expansão dos direitos fundamentais", sem especificar quais, "mais democracia e participação", sem tampouco entrar em pormenores, e a "proteção determinada do nosso meio ambiente".

O senador Javier Macaya, presidente da União Democrática Independente, disse que, independentemente do resultado, um acordo precisaria ser construído após o plebiscito:

“Mas sem imposições ou maximalismo” afirmou ao El País.

“Posso garantir que nossa vontade e nossa ação, independentemente de qual for o resultado, será convocar uma ampla unidade nacional de todos os setores, das organizações, da sociedade civil e dos partidos” disse ele. “Queremos escutar todas as vozes para poder seguir adiante com este processo, seja para implementar o texto da nova Constituição, para o que já convocamos vários constitucionalistas e diferentes personalidades da sociedade civil, seja para dar continuidade ao processo constituinte caso ganhe a outra opção, a rejeição”.

Ao votar em Santiago, o ex-presidente conservador Sebastián Piñera disse estar comprometido com um novo texto constitucional.

“Temos um compromisso com uma nova e boa Constituição, e vamos cumprir esse compromisso” disse, fazendo um apelo para que os chilenos votem: “Peço a todos os meus compatriotas que se levantem e votem com alegria, com esperança, porque o melhor do Chile ainda está pela frente, e é por isso que podemos festejar nosso país maravilhoso”.

Valedoitaúnas (O GLOBO)



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